As marcas que restam de uma batalha dolorosa

Antes havia coisas que realmente só aconteciam comigo. De algum modo incrível, o Arquiteto do mundo fazia questão de me colocar em situações ordinárias “só pra frescar” comigo. Com sorriso leve, meu companheiro de todas as horas, sempre aceitei tais desafios e vim levando-os com enorme prazer até hoje.

Nos últimos dias, no entanto, o Chefão lá de cima decidiu que todas as proezas não mais devem ser direcionadas exclusivamente para mim. E colocou uma pessoa tão tresloucada quanto eu para repartir esses momentos. É a maior alegria que poderia me acontecer.

Pois bem, há meses venho compartilhando as loucuras do mundo e da vida, entre elas a minha primeira tatuagem. Relutei no início em aceitar, relutei no caminho e relutei mais ainda durante a execução dessa barbárie com o próprio corpo.

Depois que decidi o que seria tatuado e o seu local para permanecer em mim pelo resto da vida, vivi a expectativa por esse momento durante dias. Cheguei, inclusive, a sonhar com ela da pior maneira possível. Mas ok, chegou o “grande dia”.

Acordamos cedo, fomos para a academia e depois, sozinho, parti para o dentista, onde reencontrei aleatoriamente, como sempre, alguém que já havia passado pela minha trajetória. Já durante o percurso para chegar ao tatuador, distribui juntamente com Mozão sorrisos e causos com uma família. Compartilhamos conhecimentos odontológicos como especialistas que somos.

Seguimos caminho – um tanto quanto errado, é verdade, mas seguimos. Ao chegarmos, a tensão subia e descia como em uma simulação de montanha russa de um jogo de celular.

Chegada a minha vez, senti uma dor no corpo que jamais havia sentido. Tudo isso para registrar aquilo que marcou a minha vida, e naquele momento também minha pele. Resisti como um bom guerreiro que luta a batalha mais importante que decide uma guerra. Fui firme assim como a natureza é em relação aos inúmeros percalços que o homem lhe apronta. Não desisti. Deixei escapar uma lágrima aqui e ali, mas cheguei ao final.

Já esperando os ramos, troféus e homenagens, fui para o trabalho, esperando pelo reconhecimento de glória que me era devido. Quando a primeira pessoa tocou no assunto e pediu para ver as “cicatrizes” do grandioso embate, não titubeei em mostrá-las. Comentei sobre todo o sofrimento pelo qual havia passado, puxei a camisa e exibi aquilo que era meu maior motivo de orgulho naquele momento.

Enquanto imaginava a euforia de comentários elogiosos, tive o pensamento rompido por gargalhadas retumbantes que destroçaram minhas expectativas. Disseram que todas aquelas marcas representavam absolutamente nada para a sociedade de tatuados anônimos. Ninguém reconheceu o valor das minhas dores e cicatrizes. Ninguém.

Mas tudo bem, eles não perdem por esperar. Quando eu tirar minha sobrancelha, farei questão de informar-lhes sobre mais essa minha dolorosa prática estética. Aguardem-me!

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